"Não importa o que eu faço ou o que eu sei, mas sim quem eu sou." Rudolf Steiner

sexta-feira, 20 de maio de 2011

O Trabalho em Oficinas Terapêuticas

O que é o trabalho? O que é ser doente? Ou como posso entender o destino humano?

Todo trabalho em oficinas abrigadas ou assistidas é realizado com as mãos. Todos os seres têm a necessidade de se realizar através do trabalho. É esta a forma do homem se colocar no mundo, e com o deficiente acontece a mesma coisa. Ele tem a tendência, pela sua própria dificuldade, de 'sempre ganhar tudo, de existir como ser passivo em relação ao fazer; neste trabalho o enfoque está na troca: ele dá, ele ganha; se relaciona através do trabalho.
Como o doente vive predominantemente no presente devemos ficar atento com a qualidade do trabalho e para a honestidade da atuação terapêutica. Surge a partir disso uma pergunta: "O que educa o ser humano para ser humano?". Em primeiro lugar parece ser o ser do educador ou do terapeuta. Se considerarmos como verdade que o trabalho funciona através da revelação; o cuidado com os pensamentos, sentimentos, com as atitudes é fundamental. Estar dentro e atento ao ritmo, repetição, sem esperar nada em troca, mas tendo muita esperança; pensar em imagens e confiar sempre que esse é a base do pensar futuro. Ter internamente uma imagem do ser humano, para que ela possa servir de 'exemplo: tudo isso é cultivar o humano dentro do trabalho.
No inicio do desenvolvimento a criança se coloca no mundo na dimensão. espacial: e somente depois no temporal, porque é esta que leva ao plano espiritual. O EU funciona nesta dimensão. É ela que me coloca como homem entre o CÉU e a TERRA, o deficiente, como a criança antes dos 3 anos, não tem essa relação temporal estabelecida; de forma genérica não toma posse do EU inteiramente e sua atuação não é de dentro para fora e sim o contrário, por isso a necessidade incansável de ritmo e repetição. O EU do paciente está no outro; por isso a estruturação vem toda de fora e o
trabalho funciona a partir da revelação.
Tomar posse do EU significa tomar posse da corporalidade (da cabeça aos pés) e atuar no mundo (do coração às mãos) com confiança porque se entende e realiza-se ativamente as leis do destino. Nesse sentido o trabalho do terapeuta é visto em co-autoria com o destino porque me pergunto sempre como posso ajudar o outro em sua evolução. Com as ações que os
pacientes sempre são levados a realizar, existe a possibilidade de entrelaçar uma vida com a outra, de humanizar o trabalho. A chave dessa humanização é o MOVIMENTO: motricidade ou mobilidade dos membros; ritmos internos (respiração e pulsação) e o repouso da cabeça.
Metodologicamente sempre se percorre esse caminho: motricidade grossa das pernas e braços; motricidade fina das mãos; motricidade da boca que se junta com conclusões e idéias (sempre acontecem por último e são acompanhadas de movimento).
Outra forma de se dizer da humanização é percorrer o caminho do FOGO: metabólico, Pai; CALOR: ritmo, Filho; LUZ: pensar, Sofia.
Em cada oficina aproveita-se de forma inequívoca todos os movimentos que a própria oficina oferece. Na tecelagem existe a possibilidade de trabalhar a confiança (sempre através do movimento) na fiação; trabalhar o estar no mundo e a ligação com o espiritual através dos movimentos do tecer. Na marcenaria segue-se a direção do veio da madeira, os movimentos são ordenados nesta direção, obedecendo à forma do material. Na oficina de metal a transformação se dá pelo calor, o metal chega sem forma e o trabalho é criar formas novas.
Para que se possa atuar terapeuticamente é preciso entender as leis que determinam o destino humano. E foi somente no começo desse século que o homem passa a ter a dignidade de atuar nesse campo. E para isso é preciso desenvolver uma imagem profunda do homem.

Uma estrela de 5 pontas no centro, em volta dela uma estrela de 6 pontas formada por dois triângulos que se encaixam, e em volta de tudo um grande círculo e um ponto no centro de tudo.

Esta imagem abarca o ser completo, em seu fluxo de vida (na estrela de 5 pontas), em seu processo encamatório (na estrela de 6 pontas), e na sua relação com o cosmos (na polaridade ponto e periferia). Podemos usar essa imagem como meditação e preenchê-Ia com abundancia de idéias.
Através da estrela de 5 pontas vemos o homem que foi plasmado em sua forma a partir da forma do universo. Através da estrela de 6 pontas aprendemos a ver o homem bimembrado. Uma parte superior (anímica, espiritual) e uma parte inferior (vital, que é trazido da linha da hereditariedade) . No processo encarnatório essas 2 partes se interpenetram. O ser humano, portanto é resultado dessa interação do instrumento corpóreo e da individualidade que assume esse corpo. Esse encaixe é muito flexível, se movimenta num ritmo mais amplo quando se aproxima da esfera do nascimento e se afasta na morte. Existe também um ritmo mais sutil se interpenetrando na inspiração e se afastando na expiração.
A forma como se dá essa interpenetração determina a tipologia da doença ou apenas sua tendência. Sob esse ponto de vista a saúde é definida como um tênue equilíbrio entre doença e doença. Saúde, portanto tem que ser conquistado a cada momento na interpenetração das 2 partes.
Através do circulo que tudo envolve temos a relação do macro com o micro cosmos. Podemos perceber que na dimensão do movimento (confluência do espaço-tempo) reside a possibilidade de cura. A capacidade motora se transforma em fé, em impulso religioso. De uma ação, baseada num gesto interior do terapeuta, revelado para o paciente pode surgir uma luz. O impulso religioso pode também se traduzir em que cada passo dado no sentido do conhecimento do outro, dá-se 3 passos no sentido da moralidade, do amor. Em outras palavras o terapeuta deve se colocar como um servidor.
Com suas qualidades ele atua uma lei pedagógica: "Com o membro mais elevado atua sobre o membro menos elevado do outro". Com o seu interesse, compreensão e compaixão o astral do terapeuta vivifica o etérico
do paciente. Através da devoção cria-se entusiasmo pela verdade espiritual e nesta atitude forma-se um cálice para a religiosidade, para a moralidade, edificando o astral do paciente. Quando se busca no uso da linguagem articulada, a palavra usada da forma correta; na euritmia (fala+gesto), um contato com os seres que habitam essa esfera o terapeuta passa a desenvolver a personalidade espiritual que atua formando o EU do paciente.O humor relacionado com os líquidos (portanto encontrado no etérico do terapeuta) atua no físico do paciente porque dissolve o peso de chumbo da matéria, suavizando a existência. Tanto o riso quanto o choro trabalham a respiração e dilatam o coração.
Esta é outra forma de realçar que o terapeuta, é instrumento de cura, que pode levar confiança na encarnação, tomando-se um cálice sempre pronto a transbordar para o outro, buscando as fontes de cada urna dessas qualidades. Ser instrumento é deixar perpassar, ser transparente, beber na fonte da ABUNDÂNCIA, vivenciando que a providencia divina sempre conspira a nosso favor. O nosso trabalho é se fazer caminho para essas realizações.
Essas questões e idéias e vivências levantadas até aqui norteiam o trabalho do pedagogo curativo, ou do terapeuta social; há ainda um trabalho que pode ser feito individualmente. Para isso pode-se usar massagens, escalda-pés, banho de acento, desenho de formas, trabalho religioso com as Madonas, reorganização neurológica e banhos em geral. Todos esses trabalhos visam a fortalecer a tomada de posse do EU para toda a corporalidade. As massagens podem ser relaxantes ou estimulantes, desintoxicantes ou anabo lizantes dependendo da direção dos movimentos e do óleo usado. O escalda-pé quente traz calor, consciência para os pés. O frio pode ser usado em casos de hipercinesias. Pode ser usado o sal (purifica) ou o gengibre (estimulante metabólico). O banho de acento com água fria faz baixar a força do metabólico, desestimulando a sexualidade e o erotismo. O desenho de formas estrutura e para cada temperamento ou patologia existe um trabalho mais indicado. O trabalho com as Madonas traz a devoção, a vivencia da sabedoria, amor e justiça. A reorganização neurológica traz a possibilidade de recapitular e atualizar o desenvolvimento motor. As aplicações externas e os banhos atuam sobre a pele, um reflexo do EU. São todas medidas que ajudam a harmonizar, a trazer higiene fisica e anímica para que possamos existir dignamente entre o CÉU e a TERRA.

                                              Angela Quinto, Abril 95