"Não importa o que eu faço ou o que eu sei, mas sim quem eu sou." Rudolf Steiner

segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

A sacramentalização do trabalho


A primeira pergunta que podemos fazer é : O que é trabalho?
Trabalho é algo que praticamente não podemos separar da própria vida. A vida sempre está em movimento e o trabalho vive disso, é ação, externa ou interna. Ele surge por necessidade externa, pelo social, pois sempre está direcionado ao próximo.Trabalhando, sempre sirvo ao outro, a sua finalidade é servir.
Aparentemente não é assim! Parece que eu trabalho para ganhar dinheiro para mim, quanto mais trabalho, mais eu ganho. Mas olhando mais profundamente, isto não é tudo. O outro só vai me pagar se ele estiver satisfeito com o meu trabalho, ele só irá comprar se ele for gostar e necessitar o produto. Através do trabalho faz-se uma ligação no social, uma ligação entre seres humanos. Cada um contribua com as suas capacidades para um todo, cada um tem a sua função, a sua tarefa, o seu dever. Cada um tem o seu lugar e a sua importância. No fundo não existem trabalhos melhores ou piores, só diferentes, e cada um é preciso, cada um tem a sua importância. No trabalho cada um pode se realizar a partir de suas capacidades, porém servindo.Originalmente um princípio altamente construtivo, um princípio de integração.
Quando observamos uma pessoa trabalhando, podemos ver como ela está totalmente absorvida pela tarefa. Todo o seu pensar, sentir e a sua vontade estão voltados para a execução, para ação. Mesmo nos trabalhos mentais isto acontece. A pessoa que está trabalhando esquece a si mesmo, ela age de forma entregue! É pura simpatia, é amor se realizando: Trabalho é amor em ação!
Esta sabedoria se perdeu, o que deveria ser o fruto compartilhado, o lucro, tornou-se o motivo, e ainda um motivo egoístico. O Lucro deveria ser fruto do trabalho, enquanto o motivo deveria ser o serviço.
Rudolf Steiner cita algo que ele chama de lei social principal:
"A felicidade, o Bem de uma comunidade de pessoas que trabalham em conjunto, é tanto maior, quanto menos cada um requer do lucro do próprio trabalho para si mesmo, ou seja, quanto mais ele entrega desse lucro aos outros, e quanto mais ele consegue satisfazer as próprias necessidades não do seu trabalho, mas sim do trabalho dos outros."
Por falta de clareza sobre este ponto a concorrência e a ganância se estabeleceram, o trabalho tornou-se um mal necessário, algo mecânico, vazio, insatisfatório.
Uma outra pergunta que ocupou a humanidade durante muito tempo é: O que é um sacramento?
Os sacramentos mais antigos que conhecemos são o batismo e a comunhão. No decorrer dos séculos o número aumentou muito, chegou a ser mais de 330 até chegar-nos 7 que conhecemos hoje. Um sacramento se compõe basicamente de três elementos: um texto mántrico, uma substância e um ato que une a palavra com a substância. O sacramento é um ato mágico onde fluem forças do mundo espiritual para o mundo material e logo retornam. Através do sacramento atuam forças espirituais na matéria, atuam de forma imediata! Portanto a matéria é totalmente transformada por estas forças.
E como podemos então tornar o trabalho um sacramento? Isto é possível?
No momento em que eu tenho a intenção de fazer do trabalho um serviço religioso, uma missa, e em que faço isto de fato, eu realizo o sacramento do batismo. Eu torno o próprio trabalho uma meditação, uma oração, uma oferenda ao mundo espiritual.
No momento em que eu reconheço a Idéia, o ser, na realidade física, nas coisas, no mundo, no outro, eu realizo o sacramento da comunhão.
O Leme dos Alquimistas era de fazer da mesa de trabalho um altar. Neste sentido Rudolf Steiner fala do culto invertido, onde a partir de forças humanas eleva-se a substância para o espiritual.Neste culto invertido também temos os três elementos do sacramento:
1) Reconhecer o Cristo em cada um! Cada um é uma expressão do Cristo: “O que você faz ao menor dos meus irmãos, você faz a mim mesmo." Isto significa servir ao Deus, ao Deus na matéria, no outro.
2) Desenvolver a Devoção para o Pequeno!Fazer uma observação detalhada, se interessar, ser "curioso", se espantar, perceber verdadeiramente e chegar à idéia.
3)Atuar de tal maneira que o Cristo em mim poderia acompanhar a ação! "Não eu, mas o Cristo em mim."
É através destes elementos que o trabalho é sacramentalizado.
Mas poderíamos perguntar: Isto é necessário? O trabalho precisa ou deveria se tornar um sacramento?
Para poder responder esta pergunta precisamos saber que antigamente todos os seres humanos receberam suas inspirações, suas intuições, seus dons, seu entusiasmo, seu amor, sua compaixão do próprio corpo. O próprio corpo deixava isto tudo brotar.Com o início da era de Micael no final do séc. XVIII isto mudou.A humanidade cruzou o limiar para o mundo espiritual e com isto abriu-se a possibilidade de criar a partir do próprio Eu. O corpo não existe mais como fonte, esta fonte secou. Agora precisa-se buscar e criar a partir da própria individualidade, o que antigamente foi dado naturalmente pelo corpo. Com outras palavras, a humanidade cresceu e agora a consciência precisa acompanhar este passo. Se isto não ocorrer, como ficaria nosso mundo, como ficaria a humanidade?
Olhando para o nosso mundo moderno podemos ter uma pequena idéia disso. Existem forças que querem impedir que este passo seja dado, que querem tirar a força do Eu. Para conseguir isto, eles usam os princípios da caotização, da banalização e da distração. Podemos combater estas forças e fortalecer o nosso Eu com o ritmo, que organiza o caos, com o discernimento, que nos leva ao reconhecimento da essência, e com a concentração, que deixa nos sermos mais presentes e que potencializa os nossos atos. Mas como o meu corpo não me fornece mais estas qualidades preciso conquistá-las a partir do meu próprio interior, preciso me auto-educar, buscar um caminho interior.
No dia a dia, no fazer, percebemos como isto é difícil. Como é fácil se distrair, se confundir, se enganar. Como é difícil encontrar a força pra manter um ritmo. Nossa vontade enfraqueceu, não tem mais força suficiente. Mas onde então podemos encontrar a força necessária para seguir em frente?
Encontramos esta força em tudo que é sacramental, pela entrega ao espiritual, pela entrega a vontade do próprio Cristo, pelo serviço ao Deus. Por isto o nosso trabalho precisa adquirir um caráter ritual, culto, precisa tornar-se serviço religioso.
Assim o trabalho se tornará realmente amor em ação, promovendo o princípio da fraternidade.
Assim podemos buscar o caminho interior através da auto-educação e sermos realmente livres.
Assim, no âmbito social, que Rudolf Steiner chama de Social-Religioso, encontros verdadeiros de igual pra igual poderão realmente acontecer.
Assim chegaríamos realmente aos princípios da liberdade, da igualdade e da fraternidade.
                                              Bettina Happ Dietrich

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